O terceiro capítulo da franquia de Hercule Poirot, o indefectível detetive da série de romances de Agatha Christie, foi vendido ao público de uma maneira bem diferente. Depois do ótimo “Assassinato no Expresso do Oriente” e do bonzinho “Morte do Nilo” que seguiu praticamente a mesma linha de humor / suspense do primeiro, temos um trailer de divulgação que mais parece um filme de terror e só no finalzinho aparece a face de Poirot, interpretado mais uma vez por Kenneth Branagh, repetindo também a função de diretor.
O segundo trailer, já tem a cara da franquia, mas a pegada de terror permanece e é ela mesma que se torna a essência dessa nova produção. Também pudera, pois a franquia precisava de uma chacoalhada, já que a fórmula seguida é exatamente a mesma:
- Poirot é convidado para um evento em algum lugar que devido às circunstâncias é fácil de se isolar junto a um grupo de pessoas.
- Alguém morre (ou é assassinado).
- Poirot começa as investigações, fazendo seus interrogatórios e lá pelas tantas, desvenda um mistério secundário que pode ou não ter a ver com o mistério principal.
- Outra pessoa morre (ou é assassinada).
- Poirot continua as investigações, fingindo que ainda pouco sabe e no clímax, surpreende a todos contanto quem é o/a/os/as assassino/a/os/as e daí ele é preso ou morto.
- Ainda sobra tempo para ele desvendar um outro mistério secundário menor que também pode ou não ter a ver com o principal.
Ao contrário dos outros dois filmes, é a primeira vez que o livro “A Noite das Bruxas” é adaptado para o cinema. Enquanto o livro se passa na Inglaterra, no cinema o local escolhido foi Veneza. O arco emocional / romântico de Poirot construído ao longo do filme anterior é totalmente esquecido com exceção da parte em que ele diz em “Morte do Nilo” que deseja se aposentar.
É lá que o encontramos quando uma amiga de longa data, a escritora que fez sucesso com livros baseados nele Ariadne Oliver (Tina Fey de “Free Guy”) o convida para desvendar não um crime, mas o que pensa ser uma charlatã que se passa por médium e invoca espíritos, Sra Reynolds (a oscarizada Michelle Yeoh por “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”), que fará uma de suas sessões espíritas num casarão dito assombrado para um seleto grupo de pessoas.
Quando uma das pessoas morre, Poirot relutantemente deve sair da aposentadoria para descobrir o assassino e tentar provar que a casa não é assombrada, o que vai ser difícil, pois ele próprio parece estar vendo espíritos.
Não se enganem: o filme segue exatamente o passo a passo citado anteriormente sem tirar nem por. Mas com essa pegada para o sobrenatural e a condução de Branagh muito mais dinâmica e emulando grandes cineastas do terror como o mestre Alfred Hitchcock na fotografia – feita por Haris Zambarloukos que também está no time desde o primeiro filme da franquia – e em seus ângulos de câmera, dá um frescor de originalidade que a franquia estava perdendo.
Até mesmo a questão do sobrenatural é muito bem tratada, além de ser um dos fatores que vai construindo uma nova jornada para o protagonista que deixa de ser meramente um “desvendador de casos” para ser alguém em busca de propósito.
O elenco está sempre afinado com destaque para a própria Fey cujo papel é uma metalinguagem em cima da própria escritora Agatha Christie funcionando como seu alter ego. Além disso o ator mirim Jude Hill com quem o diretor trabalhou no premiadíssimo e sensacional “Belfast” rouba todas as cenas em que ele participa.
“A Noite das Bruxas” conseguiu exatamente o que queria: dar continuidade a franquia, mas respirando novos ares com novos arcos emocionais e transformando-se nua ótima pedida de suspense (dessa vez) raíz. O diretor que lute para fazer um próximo filme ainda melhor.
Ficha Técnica:
Elenco:
Kenneth Branagh
Tina Fey
Camille Cottin
Kelly Reilly
Jude Hill
Jamie Dornan
Rowan Robinson
Michelle Yeoh
Amir El-Masry
Riccardo Scamarcio
Fernando Piloni
Emma Laird
Kyle Allen
Ali Khan
Direção:
Kenneth Branagh
História e Roteiro:
Michael Green
Produção:
Kenneth Branagh
Judy Hofflund
Simon Kinberg
Ridley Scott
Fotografia:
Haris Zambarloukos
Trilha Sonora:
Hildur Guðnadóttir
