A Baleia (“The Whale”)

Não costumo ler nada sobre filmes antes de assisti-los para não prejudicar minha experiência, muito menos a minha crítica. Só que em tempos de Oscar é quase impossível não tropeçar em pelo menos alguma manchete sobre alguns dos indicados.

Havia visto mais uma vez “A Baleia” ser descrito como “um sentimentalismo barato (sem diminuir o filme) salvo pela atuação de Brendan Fraser” (o parêntese foi meu). Ao sair do cinema, não conseguir concordar com a primeira parte.

A Baleia” é baseado numa peça de teatro de Samuel D. Hunter e se passa praticamente toda na casa do protagonista Charlie, que sofre de obesidade mórbida, cujo gatilho foi a morte de um ente querido.

Darren Aronofsky volta à direção após um hiato de quase 5 anos depois do excelente “Mãe!”, aqui ele passa longe do sentimentalismo (pelo menos até o final do filme) e deixa impressa uma de suas marcas que é mostrar uma espécie de terror no próprio fato da situação em si existir.

Ele tem a ajuda do compositor Rob Simonsen de “Projeto Adam” para dar um clima sombrio a tudo que envolve a história. Repare que os mais simples atos de Charlie, não só se transformam em verdadeiras maratonas, como a trilha sonora impõe algo sinistro em torno disso.

Todos os personagens são condenáveis, incluindo o próprio protagonista e ainda assim, tentam – alguns mais que outros – achar uma luz nessa massa de sentimento ruim que paira no ambiente. Nada mais longe do sentimentalismo.

Então chegamos a Brendan Fraser. De tempos em tempos, a Internet elege seus queridinhos: Leonardo Di Caprio, Keanu Reeves, etc. Mas antes de tudo isso, ou como diz a gíria, quando tudo era mato, Fraser já era o cara legal de todos e se tornou marca de sucesso quando fez “A Múmia” em 1999, o melhor filme de ação do gênero e que nem sua reimaginação com Tom Cruise em 2017 conseguiu superar.

Só que a vida não foi legal com Fraser que por muitos problemas de casamento e inclusive de assédio por parte de membros do comitê do Globo de Ouro (segundo em entrevista dada pelo próprio), houve um boicote em sua carreira, relegando-o a papéis secundários e terciários em filmes duvidosos como “Segredos do Passado” e, desde 2019, até um certo destaque na série da DC “Patrulha do Destino”.

Aqui vou adiantar uma curiosidade sobre como a sorte não substitui o talento, mas o talento tampouco substitui a sorte: o diretor Darren Aronofsky estava buscando o protagonista para essa sua próxima obra quando por acaso, viu o trailer do filme “12 Horas Até o Amanhecer” de 2006, filmado no Brasil e que tinha Brendan Fraser no elenco. E houve o estalo. Aronofsky ligou para Fraser e então temos aqui a melhor performance de sua carreira.

Pode parecer fácil com quilos de próteses para se parecer com aquele grau de obesidade, mas Fraser consegue um equilíbrio sublime entre a empatia e a complexidade de um personagem que fez e faz muita coisa ruim, mas acaba sendo como todo ser humano que busca o amor e muitas vezes se perde nessa busca. Se ganhar o Oscar de Melhor Ator será merecidíssimo.

O que talvez tenha torcido o nariz dos críticos mais exigentes é o finalzinho, que, aí sim, parece forçar uma redenção pretensiosa de todos os personagens ao mesmo tempo. Bobagem. Tem lá sim esse intuito, mas como uma peça de teatro, seu desfecho corre (mas não descamba) para a subjetividade através de uma bela rima entre o início e o fim da história ligada por um certo texto, o qual nos dá todo sentido da existência daquele amor de Charlie que o próprio espectador poderia duvidar de onde estivesse.

A Baleia” é um filme pesado (sem trocadilhos) até ser leve (com trocadilho sobre o desfecho) e ensina um tanto sobre a natureza complexa e muitas vezes tóxica do ser humano. Recomendadíssimo.

Curiosidades:

  • A filha de Charlie, Ellie, é interpretada por Sadie Sink de “Stranger Things”. A versão mais jovem de Ellie é interpretada pela irmã dela, Jacey Sink.
  • A pizzaria de onde Charlie pede pizza, Gambino’s, existe de verdade na cidade onde se passa o filme.
  • Na peça de teatro, a Igreja Nova Vida citada no filme é composta de Mormons e não de cristãos, como o roteiro implica.
  • Segundo os noticiários sobre política que passa na TV em algumas cenas, o filme se passa em 2016, já que falam sobre as eleições primárias para escolha dos candidatos à presidência, onde mais tarde teria Trump como a carta dos conservadores.
  • O número 12 e seus múltiplos são vistos durante todo o filme: Há uma conta bancária de $120.000 (12×10.000), há um roubo de $2.436 (12×203), há uma citação sobre 144.000 pessoas salvas (12×12.000), e fala-se de uma passagem bíblica de 12.000 (12×1.000) de pessoas ordenadas das 12 tribos de Israel. O diretor geralmente gosta de brincar com matemática em seus filmes.
  • Nos créditos finais é possível escutar sons de baleias.

Ficha Técnica:

Elenco:
Brendan Fraser
Sadie Sink
Ty Simpkins
Hong Chau
Samantha Morton
Sathya Sridharan
Jacey Sink

Direção:
Darren Aronofsky

História e Roteiro:
Samuel D. Hunter

Produção:
Darren Aronofsky
Jeremy Dawson
Ari Handel

Fotografia:
Matthew Libatique

Trilha Sonora:
Rob Simonsen

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