O Menu (“The Menu”)

Doze pessoas vão para um restaurante sofisticadíssimo numa ilha deserta, cujo chef (Ralph Fiennes de “Kingsman: A Origem”) é aclamadíssimo e, portanto, uma experiência única. Só que durante o extenso jantar, eventos macabros começam a acontecer e os convidados percebem que precisam escapar dali para sobreviver.

O filme é uma deliciosa crítica social à nossa realidade: como cada vez mais as experiências vão ficando frívolas e como cada vez mais as pessoas precisam chocar para serem “reconhecidas” ou terem seus minutos de fama.

Também é uma resposta direta à cultura da inutilidade e ostentação, como os influencers nas redes sociais que hoje pautam o jornalismo que deveria ser sério. Como influencers nada mais são que pessoas comuns que deram sorte e geraram engajamento para que as empresas encham eles de dinheiro ao divulgarem produtos, para se manterem em alta precisam chocar falando de sexo, de suas surubas ou quantas vezes transam por dia, ou formando um trisal com algum outro aspirante a subcelebridade e por aí vai.

O paralelo com a produção é que justamente o chef é talentosíssimo, mas percebeu que o público o via como mais uma experiência onde tirar a foto da comida é melhor do que saboreá-la, e daí vem sua experiência psicossocial que se traduz desse suspense de humor negro.

Outro acerto do goleiro é que a dupla de protagonistas ao lado do chef são os dois extremos da sociedade: Anya Taylor-Joy de “Amsterdam” interpreta Margot, o alter ego do cidadão comum que não entende porque tamanha devoção a tal experiência, aprendendo esse jogo de ostentação ao lado de Tyer (Nicholas Hoult de “A Batalha das Correntes”) que tem completa admiração pelo tal chef a ponto de acreditar em tudo o que ele fala e representa com seus pratos cada vez mais esquisitos e passa a não enxergar os fatos bizarros ocorridos na sua frente.

Soou familiar? É porque o roteiro e diretor Mark Mylod – que já fez a comédia bobinha “Qual o Seu Número” – conseguiram implantar mais uma crítica sócio-política de algo que afeta o mundo inteiro e vimos com intensidade nas últimas eleições: pessoas presas à manipulações de grupos de Whatsapp de tal forma que mesmo com a realidade na frente delas, não conseguiram (e não conseguem) enxergar, causando uma série de dados para a sociedade e para si mesmo.

O melhor de tudo é que com tantas críticas certeiras, a produção ainda consegue ter uma história interessante, cativante, com personagens que guardam segredos, onde não há uma grande reviravolta, mas é cheio de pequenas e sensíveis reviravoltas que vão pegando o espectador de surpresa.

A plasticidade da narrativa também é ótima, mostrando do que é feito cada prato e quanto mais bizarro a história se torna, as descrições vão ficando mais hilárias, sendo este, apenas um dos toques cômicos muito bem equilibrados para manter o filme ness universo esquisito sem descambar para uma comédia ou não o tornar sério demais.

O Menu” é um excelente jogo de xadrez onde os antagonistas precisam aprender como jogar antes que seja tarde, com tudo contado numa abordagem forte e intensa, mas com a leveza suficiente para manter o público atento e, por fim, uma sensacional crítica dos obscuros caminhos de valorização do absurdo que a sociedade vem tomando. Um pacote completo!

Curiosidades:

  • O roteirista Will Tracy veio com essa idéia do filme depois de ter participado de uma experiência semelhante onde foi para um sofisticado restaurante numa ilha privada na Noruega, no restaurante Cornelius Sjømatrestaurant, e percebeu que não conseguiria sair de lá até que o barco os trouxesse de volta.
  • Todas as idéias de comidas foram desenhadas pela chef Dominique Crenn, a única mulher chef a ter as cobiçadas 3 estrelas da Michelin pelo seu restaurante Atelier Crenn em San Francisco. O elenco dizia que a comida era tão bonita que eles tinham que ficar se lembrando que não era de verdade.
  • O jantar foi composto de 12 pessoas como na Última Ceia.
  • No início do filme Tyler diz para Margot (uma fumante) que o cigarro atrapalha o paladar (o que é verdade). Lá pelo segundo ato vemos uma outra personagem que é uma crítica gastronômica também fumando. O que significa que o chef está correto em dizer, num determinado momento, que ela é uma crítica ruim.
  • Aliás, há uma cena em que essa crítica diz que a “emulsão está quebrada”. Emulsão é qualquer molho feito de substâncias que não se misturam como água e óleo que ao ser adicionado uma determinada substância permite que essa mistura aconteça. A emulsão fica quebrada quando, mesmo após o preparo com essa substância, é possível ver partes do molho em formas de pequenas bolhas que não se misturaram.

Ficha Técnica:

Elenco:
Ralph Fiennes
Anya Taylor-Joy
Nicholas Hoult
Hong Chau
Janet McTeer
Paul Adelstein
John Leguizamo
Aimee Carrero
Reed Birney
Judith Light
Rebecca Koon
Rob Yang
Arturo Castro
Mark St. Cyr
Peter Grosz
Christina Brucato
Adam Aalderks
Jon Paul Allyn
Mel Fair

Direção:
Mark Mylod

História e Roteiro:
Seth Reiss
Will Tracy

Produção:
Katie Goodson
Betsy Koch
Adam McKay
DanTram Nguyen
Zahra Phillips

Fotografia:
Peter Deming

Trilha Sonora:
Colin Stetson

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