O cineasta australiano Baz Luhrmann nunca foi tão Baz Luhrmann quanto nessa produção. Quando o assunto é música, ele faz o seu cinema e quando o assunto é cinema ele impõe a sua música e abordagem teatral, tal qual no sensacional “Moulin Rouge” ou em “O Grande Gatsby”. Aqui ele está totalmente em seu habitat natural e confortável como um pinto no lixo.
Por isso é importante alinhar as expectativas que essa “Biografia” (sim, entre aspas) de Elvis não faz um estilo documental, muito menos é um filme que vez ou outra toca suas músicas, mas sim um espetáculo teatral e musical com edição frenética, travellings constantes e narrativa cheia de idas e vindas para provocar justamente uma experiência sensorial diferenciada. E que bom que foi assim para variar um pouco das abordagens mais burocráticos – nem por isso piores – que geralmente filmes baseados em eventos reais tem.
Mesmo com Elvis no título, o filme tem seus pilares em dois personagens centrais: Elvis (o até então desconhecido Austin Butler de “Os Mortos Não Morrem”) e o Coronel Parker (Tom Hanks de “Finch”), que foi seu empresário durante toda a sua vida e que muitos o culpam pela morte de Elvis, por ter sugado dele toda a sua energia (coisa que muitos artistas reclamam de seus empresários hoje em dia).
Como é um espetáculo, apesar de mostrar boa parte da vida de Elvis, muitos aspectos são deixados de lado como a parte ruim de seu vício em drogas, sua vida em Hollywood (bem mais longa do que mostrado); as lutas qual era famoso por participar (e de onde vem parte de seus movimentos nos shows), entre outros.
Os dois pontos altos do filme estão, primeiramente na capacidade do diretor em oferecer uma dinâmica audiovisual que compele o espectador, inclusive misturando grandes clássicos com músicas novas (a sequência com a música da Doja Cat é perfeita); e em segundo lugar as interpretações viscerais de Butler e Hanks.
Aliás, ironicamente Tom Hanks parece a personificação do Pinguim, arqui-inimigo de Batman e não seria surpresa se fosse mesmo uma das inspirações. Mas nas mãos desse consagrado ator, seu Coronel assume uma complexidade que vai além de um mero vilão e ainda funciona como um narrador da história.
Já Austin Butler abraçou Elvis com uma voracidade que mesmo com algumas óbvias diferenças, seus trejeitos, maneirismos e, principalmente, o tom de voz é estarrecedor de tão parecido com o Rei.
Finalmente, voltando ao que citei no início, Baz Luhrmann pareceu estar tão a vontade que deu uma esticada nas suas firulas que, mesmo com altíssimo nível de qualidade, arrastou a narrativa para mais de 2h30 de filme, tornando-o um pouco cansativo. Ao tomar a decisão criativa de substituir conteúdo histórico por números teatrais, talvez valesse um pouco mais de equilíbrio.
“Elvis” é um ótimo espetáculo com boa história, algumas invenções e firulas que funcionam em sua maioria, trilha sonora de arrepiar e atuações dignas de indicações.
Curiosidades:
- Algumas partes que nunca aconteceram na realidade: a conversa do Coronel com Elvis no parque de diversões; a cena em que ele demite o Coronel em pleno show.
- Em nenhum momento do filme Elvis aparece comendo pasta de amendoim. Ele era famoso por adorar essa comida.
- Mesmo nas entrevistas Austin Butler ainda preservava o sotaque sulista, como uma espécie de gatilho.
- A produção teve que ser interrompida quando Tom Hanks pegou COVID.
- Apesar de não aparecer no filme, o pai de Elvis se casou 2 anos após sua mãe falecer e só foi morrer em 1979, dois anos depois da morte de Elvis.
- Outra coisa que não apareceu no filme, mas pela qual Elvis era famoso foi ser a primeira pessoa que tinha um telefone analógico em seu carro.
- O filme cita que o herói principal de Elvis era o Capitão Marvel Jr. Ao contrário do que podem pensar, o herói não era da Marvel, foi comprado pela DC e passou a se chamar Shazam.
- No título do filme, você pode notar as letras pequenas “TCB”. Significa “Taking Care of Business”, nome da banda que acompanhou Elvis de 1969 até a sua morte. Depois continuaram tocando em separado com artistas diferentes.
- Elvis era fã de “Star Trek” e por isso aparecem posters do filme na sala de gravação de seu especial de Natal em 1968. Entretanto, no início aparece um especial de “Star Trek” de 1977 que na realidade nunca aconteceu.
- No dia seguinte após das filmagens, Austin Butler foi internado no hospital com apendicite.
- O Coronel Parker morreu em 1997 com 87 anos, 20 anos depois da morte de Elvis.
- Aparece no filme sua tentativa de participar da regravação de “Nasce Uma Estrela” com Barbra Streisand. Quem ficou com o papel foi o ator Kris Kristofferson.
- Também há uma cena próximo ao final em que ele diz à sua ex-esposa “I will Always love you”, título da música country de Dolly Parton. Ele tentou regravar a música, mas o Coronel só deixaria se Parton renunciasse aos direitos autorais. Como ela não o fez, a gravação não rolou. Parton estava certa em não ter feito: na década de 90, Whitney Houston faz essa regravação para o filme “O Guarda Costas” e Dolly Parton abocanhou uma fortuna pelo sucesso da música.
Ficha Técnica:
Elenco:
Austin Butler
Tom Hanks
Olivia DeJonge
Helen Thomson
Richard Roxburgh
Kelvin Harrison Jr.
David Wenham
Kodi Smit-McPhee
Luke Bracey
Dacre Montgomery
Leon Ford
Gary Clark Jr.
Yola
Natasha Bassett
Xavier Samuel
Adam Dunn
Alton Mason
Shonka Dukureh
David Gannon
Shannon Sanders
Charles Grounds
Josh McConville
Kate Mulvany
Gareth Davies
Chaydon Jay
Direção:
Baz Luhrmann
Produção:
Gail Berman
Baz Luhrmann
Catherine Martin
Patrick McCormick
Schuyler Weiss
Roteiro:
Baz Luhrmann
Sam Bromell
Craig Pearce
Jeremy Doner
Fotografia:
Mandy Walker
Trilha Sonora:
Elliott Wheeler