Deus escreve certo por linhas tortas. O roteirista e diretor David Gordon Green faz o inverso. Ele continua na sua cruzada de reviver grandes clássicos do terror através de trilogias e destruindo-os no processo. “Halloween” começou até que bem, melhorou na segunda parte, mas descambou para algo sem a menor noção na última parte, acabando com tudo o que fora construído até então.
Esse novo “O Exorcista” já tem em seu contrato firmado a filmagem de uma trilogia independente de o primeiro fazer sucesso ou não. Por esse começo nem o diabo vai escapar dessa roubada.
No início já se tem a impressão de que o diretor nem chegou a ver o grande clássico de 1973 dirigido por William Friedkin que abominou essa nova produção antes mesmo de ver e acabou falecendo em agosto, antes dela estrear nos cinemas (sorte a dele).
Sem sequer uma conexão com qualquer filme da franquia, duas crianças se perdem na floresta para fazer uma “brincadeira” com espíritos e três dias depois reaparecem, trazendo com elas uma entidade que vai possuí-las. Não perguntem a matemática de uma entidade possuir duas meninas. Já está no pacote que o espectador tem que engolir.
O protagonista aqui é o pai de uma delas, Victor (Leslie Odom Jr. de “Glass Onion”), que se diz cético (por isso o contraponto do subtítulo – “O Devoto”) – mas na hora em que a enfermeira interpretada por Ann Dowd (“Impulso de Vingança”) sugere que sua filha e a amiguinha dela estão possuídas, não tarda a acreditar na hora no coisa ruim.
Se o desenvolvimento até então estava sendo feito com certo desleixo e poucos sustos, daí para frente só desanda mais.
Então surge o fraquíssimo vínculo com o original com a desnecessária entrada de Ellen Burstyn que fez a mãe de Reagan (Linda Blair) no clássico, a qual sai de cena tão rápido quanto entrou e, tudo o que faz em tela é passar um vexame danado, numa das cenas mais estúpidas de filmes de exorcismo.
Pausa: em todas as entrevistas Burstyn não cansa de dizer que só participou do filme por dinheiro, depois que duplicaram seu salário.
Pula para o terceiro ato: o ritual mais embaraçoso da história. É como se ao invés de pegarem os Vingadores para destruir Thanos, tivessem escolhido a Carreta Furacão. Colocaram “meio que” um representante de cada religião – católica, evangélica, umbandista e até a enfermeira que quebra uma de padre e a partir daí qualquer que fosse a lógica percorrida pelo roteiro se desfaz.
Há um pequeno plot twist interessante, mas esquecível em 30 segundos em meio à uma barulheira e poluição sonora que o diretor confundiu com sustos para que o espectador não tivesse a mínima idéia do que estava acontecendo.
Termina o filme e não sabe se o demônio ganhou ou perdeu. Se o inferno existe, deve ter uma sessão de “O Exorcista – O Devoto” 24 horas por dia para os recém chegados.
Curiosidades:
- Linda Blair, a Reagan, garota possuída no original de 73 atuou como consultora do filme para dar mais credibilidade a atuação das atrizes mirins.
- No começa do filme é possível ver no quarto de Ângela uma pequena miniatura do demônio que Reagan desenha no clássico original.
- O filme é lançado 50 anos depois do original.
- O nome do demônio no clássico de 73 era Pazuzu. Apesar de neste filme, não ser citado em nenhum momento o nome do demônio, nos créditos finais, ele aparece como Lamashtu, que, coincidência ou não, na mitologia mesopotâmica é inimigo de Pazuzu.
Ficha Técnica:
Elenco:
Leslie Odom Jr.
Olivia O’Neill
Lidya Jewett
Ann Dowd
Ellen Burstyn
Jennifer Nettles
Raphael Sbarge
Norbert Leo Butz
Ben Bladon
Chloe Traicos
E.J. Bonilla
Lize Johnston
Danny McCarthy
Linda Blair
Direção:
David Gordon Green
História e Roteiro:
Peter Sattler
Scott Teems
Danny McBride
David Gordon Green
Produção:
Jason Blum
David Robinson
James G. Robinson
Fotografia:
Michael Simmonds
Trilha Sonora:
Amman Abbasi
David Wingo
