Drama familiar. Romance teen. Música no ar. Como três temas tão batidos conseguiram compor um filme tão especial? O segredo está na palavra especial, pois a abordagem dessa sensacional premissa é o que aconteceria se o especial fosse ser normal.
Emilia Jones de “A Casa do Medo” (e candidata a ser a nova Emma Stone com seu carisma) é Ruby a filha caçula de uma família de surdos-mudos pescadores, sendo que ela é a única que não tem a deficiência. Então ela que ajuda sua família em tudo, mas ironicamente começa a fazer um curso de música e se apaixona por cantar, uma das poucas habilidades que sua família não tem condições de apreciar.
É aquele momento em que alguém pode pensar: como ninguém pensou nessa premissa antes. Na verdade já pensaram. A produção é uma espécie de remake de um filme francês chamado “A Família Bélier” de 2014.
Mesmo com essa interessante peculiaridade bastante explorada na trama ainda há os clichês básicos do gênero como o professor de música pouco ortodoxo (Eugenio Derbez de “Como Se Tornar Um Conquistador” com seu carisma nas alturas) e o crush que pouco acrescenta, mas que compõe o desenrolar da jornada emocional de Ruby.
Estruturalmente o roteiro é forte e os dilemas pelo qual a protagonista passa são verdadeiramente relevantes e desde o início o espectador cria uma afinidade com sua situação. O elenco está ótimo e o fato da família ser composta por artistas surdos-mudos de verdade dá um tapa de realidade que faz uma imensa diferença na abordagem de comunicação: vários diálogos e discussões são em completo silêncio, o que não só traz algo de novo na narrativa, como também ajuda o público a entender ainda mais o mundo de quem alcança ou quer alcançar sua independência e autonomia mesmo não escutando.
A diretora Sian Heder de “Tallulah” soube fazer a platéia se emocionar em vários momentos, mas há pelo menos 3 cenas emblemáticas no terceiro ato, ambas sobre como seus pais podem entender que a filha é tão boa em canto, habilidade que ela escolheu amar. Difícil segurar o choro aí.
O próprio “No Ritmo do Coração” traduz exatamente o uso do ritmo – o que os surdos-mudos usam para “escutar” uma música – para que essa música atinja seus corações. E assim a obra ganha o coração de todos de forma despretensiosa, clichês que funcionam e uma dinâmica equilibrada e com um carisma no nível máximo. É a melhor Sessão da Tarde que você vai ver em décadas.
Curiosidades:
– O título original CODA significa “Children Of Deaf Parents” (Crianças de Pais Surdos). CODA também é um símbolo de partitura musical que significa passagem da música numa composição. Esse símbolo pode ser visto nas partituras que Ruby estuda.
– Todos os intérpretes de surdos-mudos contratados para a produção são CODA.
– Emilia Jones passou 9 meses em aulas de canto, libras e de pescaria para desempenhar seu papel.
– As cenas de pescaria foram todas feitas com procedimentos de verdade na prática. Há uma parte do filme em que os pescadores ficam irritados quando aparecem fiscais para monitorar a sua atividade. Na sequencia onde aparece uma fiscal, havia realmente uma fiscal (que não era a mesma) no barco para monitorar a cena, já que era filmada no mar. É a vida imitando a arte.
– O filme francês “A Família Bélier” (2014), no qual “O Ritmo do Coração” foi inspirado não fez muito sucesso por causa da repercussão ruim de que dos três membros da família surdos-mudos, apenas um era de verdade. Os outros eram artistas que escutavam normalmente. Isso causou um profundo mal-estar nas associações de deficientes auditivos.
– Eugenio Derbez dublou sua própria voz em espanhol para a versão latino americana do filme.
Ficha Técnica
Elenco:
Emilia Jones
Troy Kotsur
Marlee Matlin
Eugenio Derbez
Amy Forsyth
Daniel Durant
John Fiore
Lonnie Farmer
Kevin Chapman
Courtland Jones
Molly Beth Thomas
Ferdia Walsh-Peelo
Ayana Brown
Direção:
Sian Heder
Produção:
Fabrice Gianfermi
Philippe Rousselet
Jérôme Seydoux
Patrick Wachsberger
Fotografia:
Paula Huidobro
Trilha Sonora:
Marius De Vries