Bacurau

Se Quentin Tarantino fosse nordestino, provavelmente um de seus filmes seria “Bacurau”. A produção de Juliano Dornelles e Kleber Mendonça Filho (“Aquarius”) prova que você consegue desenvolver um tema universal, agindo local e politizando uma narrativa sem apelações desnecessárias.

A minúscula cidade de Bacurau em pleno sertão nordestino sofre com falta de tudo, mas seu povo se mantém unido entre trancos e barrancos, inclusive durante o enterro de uma de suas decanas fundadoras. Nesse cenário desolado que quase lembra “Mad Max” (sem dúvida o personagem Lunga é inspirado nesse universo), o primeiro ato estabelece bem a dinâmica entre os vários moradores com pouco protagonismo entre eles, deixando o numeroso elenco praticamente em pé de igualdade, com – se muito – destaque para Sonia Braga como a médica alcoólatra da cidade, Barbara Colen como a jovem Teresa volta para sua família (ambas de “Aquarius”) e o desconhecido Thomas Aquino como um ex-matador de aluguel. As coisas se complicam quando a cidade está prestes a ser atacada por desconhecidos estrangeiros.

Além de uma condução de narrativa primorosa da dupla de diretores e da sensacional fotografia de Pedro Sotero (parceiro dos filmes de Kleber Mendonça Filho), a grande sacada do roteiro é que até a metade da projeção o próprio espectador ainda não sabe qual rumo o filme toma, tendo contato apenas com a peculiar dinâmica entre os cidadãos do vilarejo e alguns indícios aqui e ali de que algo está para acontecer. Tanto que chega a ser surpreendente que um tema mostrado em tantos filmes de ação americanos, inclusive de segunda categoria, tenha uma abordagem tão diferenciada nesta obra.

Ela funciona muito bem como uma crítica social atual sobre a política de liberação de armas (o relato corriqueiro de um gringo sobre como quase ele causa um massacre num supermercado cai como uma luva), ao capitalismo selvagem que faz o Brasil se vender para a cultura americana e a própria banalização da morte. Tudo é certeiro, mesmo que em alguns momentos, os diretores ultrapassem um pouco o bom senso em nome da arte.

E como todo bom filme de Tarantino, há um ótimo desenvolvimento de personagens até um terceiro ato que mistura violência com pitadas de humor e que não deve em nada aos clássicos do diretor norte-americano.

Bacurau” é ao mesmo tempo uma originalíssima pérola brasileira com críticas contundentes e no alvo, mas também imita ao próprio país do qual quer se libertar. Se às vezes a vida imita a arte, aqui também a arte imita a arte, mas o faz com a qualidade de um original. Paradoxal? Hipocrisia? Pouco importa. É um filmaço e um mais um golaço do Brasil.

Ficha Técnica

Elenco:
Sônia Braga
Barbara Colen
Thomas Aquino
Udo Kier
Karine Teles
Alli Willow
Chris Doubek
Julia Marie Peterson
Jonny Mars
Antonio Saboia
Brian Townes
Silvero Pereira
James Turpin
Lia de Itamaracá
Wilson Rabelo

Direção:
Juliano Dornelles
Kleber Mendonça Filho

Produção:
Saïd Ben Saïd
Emilie Lesclaux
Michel Merkt

Fotografia:
Pedro Sotero

Trilha Sonora:
Mateus Alves
Tomaz Alves Souza

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