Taylor Russel da saga “Escape Room” é Maren, jovem que, após seu pai tê-la abandonado, sai em busca da mãe para redescobrir a si mesma quando, no meio da viagem, conhece Lee (Timothée Chalamet de “A Crônica Francesa”) e engata com ele uma peculiar relação.
Ambos partilham algo em comum: são canibais. Isso mesmo. Eles têm compulsão por comer carne humana.
Ao assistir a essa bela obra, o cinéfilo pode ter uma sensação de dejavú. Justificável: adaptado do livro homônimo de Camille DeAngelis, a história tem a exata mesma essência de “Entrevista com o Vampiro”, escrita por Anne Rice e levada aos cinemas em 1994, um filmaço com Tom Cruise e Brad Pitt.
A Maren de Taylor Russel é o Louis de Brad Pitt, vampiro novato que começa a conhecer um novo universo. Enquanto isso o Vampiro Lestat nessa obra é dividido entre o Lee de Timothée Chalamet e o coadjuvante antagonista Sully interpretado de forma magistral por Mark Rylance de “O Alfaiate“.
O roteiro acerta na abordagem do que é ser uma canibal novata sem inventar muitos artifícios e também entra fundo no dilema ético do que seria um ato de sobrevivência, uma escolha ou o que é um assassinato para o bem ou para o mal. A própria dinâmica entre os personagens segue de forma natural sem precisar forçar a barra, inclusive também lembra o clássico de Anne Rice como num road movie em que os canibais (apesar da expressão praticamente não ser usada no filme) se reconhecem pelo cheiro, tal qual os vampiros.
Só que o cineasta americano Luca Guadagnino do premiado “Me Chame Pelo Seu Nome” – onde Chalamet também é protagonista – foi além: fez um filme retratando o sul americano dos anos 80 numa realidade crua, muito longe da glamourização de Hollywood.
Ao contrário de vampiros sofisticados, canibais – e porque não todos os demais – vivem num interior de muito mais miséria do que êxito, onde a concentração de renda na mão de poucos descobre os muitos necessitados, e onde viver como ambulante ou nômade tira a dignidade, mas mantém a existência. Nessa camada que envolve toda a trama, o diretor lembra os melhores momentos de Gus Van Sant, outro cineasta craque em ler os EUA.
Contudo, a história não tira os olhos dos personagens, trazendo um terceiro ato impactante com pitadas de vários outros clássicos. Há um momento em particular onde por pouco não se tem o mesmo choque de “Se7en – Os Sete Pecados Capítais”, seguido do clássico de 1983 “Fome de Viver” com o andrógino ícone David Bowie. Os últimos segundos ainda trazem um excelente simbolismo entre uma casa arrumada e todo o significado do que a expressão “até os ossos” tem a dizer.
“Até os Ossos” ao mesmo tempo que é uma ventania de originalidade, faz uma grande homenagem a grandes histórias com personagens que tentam a redenção dentro de uma existência cujo terror constante é inevitável.
Ficha Técnica:
Elenco:
Taylor Russell
Timothée Chalamet
Mark Rylance
Anna Cobb
David Gordon Green
Chloë Sevigny
Kendle Coffey
André Holland
Ellie Parker
Madeleine Hall
Sean Bridgers
Michael Stuhlbarg
Marcia Dangerfield
Jessica Harper
Burgess Byrd
Direção:
Luca Guadagnino
História e Roteiro:
David Kajganich
Camille DeAngelis
Produção:
Timothée Chalamet
Luca Guadagnino
David Kajganich
Francesco Melzi d’Eril
Lorenzo Mieli
Marco Morabito
Theresa Park
Peter Spears
Fotografia:
Arseni Khachaturan
Trilha Sonora:
Trent Reznor
Atticus Ross