O Rastro

O Brasil finalmente aprendeu a fazer um filme de terror e até a fazer um trailer de filme de terror e isso é motivo de comemoração não só para os amantes do gênero como também para o cinema nacional como um todo que parecia só se dar bem – quando muito – em um ou dois gêneros. E toda essa festa por uma produção que nem é um suprassumo, mas já vale.

Rafael Cardoso é João, médico da Secretaria de Saúde responsável por uma transferência em massa dos pacientes do Hospital São José, prestes a fechar pela sua precariedade, para outros hospitais. Só que no outro dia ele descobre que uma das pacientes – uma criança admitida de última hora – sumiu e ele fica obcecado em encontra-la, prejudicando seu casamento com Leila (Leandra Leal de “O Lobo Atrás da Porta”) e tornando ainda mais turbulenta a relação com seu sogro Heitor (Jonas Bloch de “O Escaravelho do Diabo”) que, por sinal, é o diretor do hospital que o genro acabara de fechar. No meio desse caos estranhos fenômenos sobrenaturais passam a assombrar o casal.

O diretor J.C. Feyer é estreante, mas já sabe o que quer e junto com o fotógrafo Gustavo Hadba de “Faroeste Caboclo” conseguem ângulos e tomadas onde as imagens falam mais do que palavras e encantam, como no sonho de Leila onde há uma ótima sacada de troca de personagens com um simples movimento de câmera, ou na tensa conversa entre o casal que é embaçada apenas para poder ter destaque no reflexo de um refrigerador, ou ainda quando o protagonista corre numa iluminação onde apenas seu perfil em sombra pode ser visto, denotando o crescente desequilíbrio de personagem.

O roteiro é muito hábil em colocar um contexto que é a cara do Brasil: o descaso com o bem público e a corrupção contribuindo para o risco de vida de muitos e chegando num ponto surpreendente e até talvez sendo uma nova forma de terror. Se o suspense em torno da trama é bastante aderente, a parte do sobrenatural nem tanto. O diretor se apoia numa sonoplastia exageradíssima que chega mais a incomodar o espectador do que o próprio personagem (a cena em que ele joga um som alto só porque a menina pega na mão do João é o cúmulo). E pior: toda a parte sobrenatural pouco influencia no curso natural da história. Para se ter uma idéia, o destino de João, o mais afetado com os fenômenos, nada muda por causa deles.

Ainda assim, o esforço para que haja uma correlação entre o real e o sobrenatural mesmo que meio forçada e para que o desfecho, apesar de descolado da trama, tenha um bom efeito dramático, garante uma composição digna de ser apresentável no cinema e já valer o ingresso. Que o Brasil mande mais desses!

Curiosidades:

– Filmado em uma ala abandonada de um hospital carioca que estava prestes a ser realmente fechado durante a produção, o Beneficência Portuguesa.

Ficha Técnica

Elenco:
Rafael Cardoso
Leandra Leal
Cláudia Abreu
Alice Wegmann
Felipe Camargo
Jonas Bloch
Sura Berditchevsky
Júlia Lund
Natália Maciel Guedes
Gustavo Novaes
Érico Brás
Marcelo Olinto
Ricardo Ventura
Alberto Flaksman
Kelzy Ecard

Direção:
J.C. Feyer

Produção:
Malu Miranda
André Pereira

Fotografia:
Gustavo Hadba

Trilha Sonora:
Bernardo Uzeda

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