O novo filme do mestre Guillermo del Toro, Oscarizado pelo sensacional “A Forma da Água” é a adaptação do livro homônimo de William Lindsay Gresham que já teve uma versão para o cinema feita em 1947 chamada “O Beco das Almas Perdidas”. Essa informação é importante porque grande parte da análise está na transposição entre o livro e o filme.
O livro é uma construção de personagem. É a ascensão e queda de um misterioso e ambicioso homem que ao se juntar a um circo no início da 2ª Guerra Mundial, descobre truques que podem fazer dele uma celebridade, mas cujo preço a pagar pela sua ambição será alto demais.
Nessa adaptação, esse homem é Stanley, vivido com maestria por Bradley Cooper (“A Mula”) que percorre a trajetória já citada. Descrever mais sobre a sinopse seria avançar sobre a história ainda não contada.
Mas antes, vamos dar um passo atrás e reconhecer que a produção gótica típica de Del Toro é uma atração a parte, com um design e fotografia de Dan Laustsen (“John Wick 3”) de cair o queixo, sendo tudo o que se espera de uma obra como essa, desde cenografia, reconstituição de época, figurino etc.
O diretor reuniu um elenco de ouro e conseguiu nas performances um equilíbrio entre a caricatura diabólica de seus personagens e suas camadas emocionais que os dão profundidade.
Entretanto, temos quase duas horas e meia a percorrer e a grande questão do roteiro é que o filme se divide em duas partes: a chegada e estada de Stanley no circo; e quando ele foge com Molly (Rooney Mara de “A Pé Ele Não Vai Longe”) e se eleva com seu número de médium, tornando-se conhecido, até que a misteriosa Lilith (Cate Blanchett de “Não Olhe Para Cima”) atravessa seu caminho.
É aí onde o filme se desencontra do livro e, mais ainda do espectador. Como já citado, o livro é uma construção de personagem e tudo o que ele leva do seu presente, reflete no futuro. O livro tem tempo para isso. O leitor também. Já o filme comete o pecado de querer abraçar todos os aspectos do livro, mas sem ter o tempo ou a habilidade de construir as pontes entre a primeira e a segunda parte.
Trocando em miúdos, é que se a segunda parte aproveitasse apenas 10% a 15% do que foi exposto na primeira parte. Mais ainda, é como se a segunda parte pudesse se manter sozinha, sem necessidade da antecessora ou no máximo, explorando uns 15 a 20 minutos daquela. Daí fica aquela sensação de que pouco aconteceu na primeira metade, porque pouco foi levado para a segunda. Sem a construção de pontes, todo o resto vira gordura e é praticamente esquecível.
Claro que o desfecho faz uma ponte poética sensacional com um determinado aspecto do início, mas ainda assim é muito pouco para justificar a duração do filme ou seus primeiros eventos. Até mesmo o passado obscuro do protagonista, do qual se faz tanto suspense, tem pouco a agregar no resultado.
Tal qual o desfecho, existem cenas memoráveis como o malévolo discurso do dono do circo (Willem Dafoe de “A Crônica Francesa“) sobre como se cria a atração do selvagem ou ainda os inteligentes gatilhos de Lilith em Stanley numa interessante batalha psicológica, ou finalmente Pete (David Strathairn de “Criminosos de Novembro”) futuro mentor de Stanley na primeira vez em que ele encena o número de médium.
“O Beco do Pesadelo” tem elenco e produção de primeira linha, direção de arte e aspectos técnicos impecáveis, mas não soube o que fazer com tanto conteúdo, o qual encantou mais seus realizadores do que os espectadores.
Ficha Técnica
Elenco:
Bradley Cooper
Cate Blanchett
Toni Collette
Willem Dafoe
Richard Jenkins
Rooney Mara
Ron Perlman
Mary Steenburgen
David Strathairn
Clifton Collins Jr.
Tim Blake Nelson
Mark Povinelli
Peter MacNeill
Holt McCallany
Paul Anderson
Lara Jean Chorostecki
Jim Beaver
David Hewlett
Sarah Mennell
Mike Hill
Caleb Ellsworth-Clark
Dian Bachar
Troy James
Matthew MacCallum
Samantha Rodes
Jesse Buck
Perry Mucci
Direção:
Guillermo del Toro
Produção:
Bradley Cooper
J. Miles Dale
Guillermo del Toro
Fotografia:
Dan Laustsen
Trilha Sonora:
Nathan Johnson