Produzir e lançar um filme que faz um retrato de Donald Trump, suas origens e sua trajetória, numa visão claramente anti-Trump, justamente às vésperas das eleições americanas é uma decisão tão política quanto artística. Apesar de mesmo artisticamente seja uma crítica social que se enquadra perfeitamente no contexto americano, ao analisarmos artisticamente, ainda assim, constatamos que é um filmaço, lembrando que logo no início há claramente a descrição de que o filme é baseado em eventos reais, mas que há uma parte de ficção por questões dramáticas e narrativas.
Dirigido pelo premiado cineasta iraniano Ali Abbasi, o filme é todo feito em estilo documental com a granulação e enquadramento dos anos 70 e 80, sempre com a câmera em movimento, cortes rápidos, o que acrescenta um ritmo a mais na história já com um rico conteúdo.
Ele mostra a origem de Donald Trump (Sebastian Stan de “Dinheiro Fácil”) como herdeiro de uma já rica imobiliária, mas em problemas e como ele decola a partir de sua peculiar relação com o advogado conservador, nada ético Roy Cohn (Jeremy Strong de “Os 7 de Chicago”, perfeito) que ensina ao ainda jovem executivo todas as artimanhas do poder e como sair sempre por cima, cujas três regras de vencer inclusive estão no livro de Tony Schwartz sobre Trump, “A Arte da Negociação”.
Misturando imagens de arquivo com as filmagens, o diretor imprime uma excelente reconstituição de época não só no design de produção, figurino e outros elementos técnicos, como também na própria abordagem narrativa, como se estivéssemos vendo um programa de TV do início dos anos 80. Os saltos temporais são marcados por grandes músicas de sua época – uma trilha sensacional, diga-se de passagem – destacando Blue Monday do New Order e Always on my Mind do Pet Shop Boys.
Sebastian Stan chegou no seu limite, incorporando os trejeitos de Trump, incluindo seu biquinho com uma prótese, de modo perfeitamente convincente, mesmo com as claras diferenças físicas que nem a pesada maquiagem pôde desfazer.
Em paralelo Jeremy Strong é, de longe, a melhor atuação e desde já se torna presença obrigatória na lista de indicados a todas as premiações de ator coadjuvante do ano que vem. Muito mais que a semelhança física (que é assombrosa, basta pesquisar no Google), o arco de seu personagem é o motor da história tanto ou mais do que Trump. E Strong aproveita cada segundo que ele tem em tela para potencializar seu personagem.
Todo o machismo, misoginia e ignorância do protagonista, seja aprendida com a sociedade, família ou com o próprio Roy, é mostrada de forma escancarada, mas também usando de complexas camadas emocionais que deixam os personagens mais humanos, no sentido de falíveis e não no de melhores.
“O Aprendiz” é um daqueles filmes de eventos pessoas reais digno de premiações, mas que deve dividir opiniões, muito mais pela política do que por critérios artísticos (e talvez ele tenha essa intenção). De uma forma ou de outra é puro cinema e obrigatório.
Ficha Técnica:
Elenco:
Sebastian Stan
Jeremy Strong
Maria Bakalova
Martin Donovan
Catherine McNally
Charlie Carrick
Ben Sullivan
Mark Rendall
Joe Pingue
Jim Monaco
Bruce Beaton
Ian D. Clark
Direção:
Ali Abbasi
História e Roteiro:
Gabriel Sherman
Produção:
Ali Abbasi
Daniel Bekerman
Julianne Forde
Jacob Jarek
Louis Tisné
Ruth Treacy
Fotografia:
Kasper Tuxen
Trilha Sonora:
Olivier Bugge Coutté
Olivia Neergaard-Holm