Um dos grandes desafios de qualquer roteiro é abraçar vários temas dentro de uma mesma história, ao invés de simplesmente construir subtramas aleatórias para mandar várias mensagens. O diretor Bong Joon Ho do premiadíssimo “Parasita” consegue uma extrair de comédia inteligente, diversas críticas sociais e políticas e, ao mesmo tempo, falar sobre psicologia, individualidade e amor.
Nosso novo Batman, Robert Pattinson, está impecável como Mickey, que num futuro alternativo foge para uma excursão para colonização de outro planeta numa posição profissional no mínimo peculiar: ele vira um “dispensável”, isto é, um funcionário pago para enfrentar situações mortais para logo em seguida ser reimpresso novamente, dotado de todas as suas memórias.
Ele até arranja uma namorada (Naomi Ackie de “Pisque Duas Vezes”), mas as coisas se complicam quando ele é equivocadamente reimpresso sem ter morrido, virando um múltiplo, onde ambos podem ser punidos com pena de morte, estabelecido pelo líder fascista da nave, o excêntrico Marshall (Mark Ruffalo de “Pobres Criaturas”).
Sim, você leu certo a palavra fascista e daí já começa uma ótima crítica e como o fascismo começa a ser implementado, desde algo aparentemente apenas esquisito, tá sair do controle da maioria, construção essa que o diretor faz perfeitamente desde o primeiro ato até o desfecho. Inclusive há uma parte da colonização que lembra os conflitos em produções como “Pocahontas” ou “Avatar”.
Amizade e amor também são discutidos, juntamente com a ética da ciência, já que ter uma relação com alguém que morre e volta em outro corpo com as mesmas memórias por si só já é objeto de discussão, principalmente quando existem dois ao mesmo tempo que passam então a ter memórias e pontos de vistas diferentes. Nesse momento o papel de Naomi Ackie é fundamental na discussão bem como do melhor amigo “da onça” de Mickey, Timo, interpretado de forma deliciosamente cínica por Steven Yeun de “Não Olhe Para Cima”.
Podíamos falar do excelente design de produção e efeitos especiais, mas vamos pular para o protagonista, Robert Pattinson, que conseguiu uma interpretação digna de Jerry Lewis, ficando a um patamar acima dos comediantes tradicionais: seu desajeitado Mickey está longe de ser simplório, principalmente quando imprimem seu duplo mais errático e destemido. As gags físicas e sutis diferenças entre cada um fazem de Pattinson multifacetado e uma atração à parte.
Baseado no livro de Edward Ashton , “Mickey 17” é mais um golaço de Bong Joon Ho e que prova que a arte pode ser cômica e ainda sim discutir assuntos sérios e relevantes de forma leve e com resultado marcante.
Curiosidades:
- As duas principais diferenças entre o filme e o livro começa no título que no livro é Mickey 7, já que ele só morre 6 vezes; e no fato de que o Mickey 9 (o duplo) não tem uma diferença acentuada de temperamento tal qual no filme.
- Antes de chegar no seu 17º clone, Robert Pattinson filmava as cenas sem saber qual número ele era para tornar seu personagem ainda mais caótico.
Ficha Técnica:
Elenco:
Robert Pattinson
Naomi Ackie
Steven Yeun
Mark Ruffalo
Toni Collette
Anamaria Vartolomei
Michael Monroe
Patsy Ferran
Cameron Britton
Ian Hanmore
Daniel Henshall
Ellen Robertson
Edward Davis
Steve Park
Direção:
Bong Joon Ho
História e Roteiro:
Bong Joon Ho
Produção:
Dooho Choi
Dede Gardner
Bong Joon Ho
Jeremy Kleiner
Fotografia:
Darius Khondji
Trilha Sonora:
Jung Jae-il