O projeto dos sonhos do icônico diretor Francis Ford Coppola, responsável por filmes que mudaram cinema como “Apocalipse Now” ou a trilogia “O Poderoso Chefão”, que demorou mais de 30 anos para se materializar. Toda vez que os trabalhos iam começar, algo acontecia: ou era problemas de financiamento, ou roteiro inacabado, ou outros projetos passavam na frente… até o 11/09 foi motivo para adiamento.
Eis que Coppola finalmente arrecadou o dinheiro, finalizou o roteiro e partiu para cima do que deveria ser uma crítica social à degradação dos valores da humanidade numa abordagem surrealista, fazendo uma analogia entre a Roma antiga e uma “Nova Roma”, mas com realidades sociais semelhantes.
Pelo menos era isso que deveria ser o produto final. Com tantas idas e vindas e remendas de roteiro, infelizmente o filme descamba para um punhado de mensagens boas, numa abordagem artística duvidosa e com conteúdo fragmentado.
Vamos a sinopse: na fictícia Nova Roma, César (Adam Driver de “Ferrari”) é um engenheiro visionário e excêntrico que deseja construir num dos bairros o que ele chamou de Megalópolis, uma minicidade utópica que resolveria todos os problemas sociais e urbanos. Ele é visto com desdém pelo prefeito Cícero (Giancarlo Esposito de “MaXXXine”), mas sua filha Júlia (Nathalie Emmanuel de “Uma Prova de Coragem”) acaba se apaixonando por César, o qual ainda tem que lidar com a maldade de seu primo Clodio (Shia LaBeouf de “O Falcão Manteiga de Amendoim”) e sua ex-amante Wow (Aubrey Plaza de “Urso Negro”).
Chega a ser deliciosamente óbvio a analogia com Roma antiga: Júlia + César, Clodio = Claudius, Cicero, entre vários outros personagens. As tramas de intriga, traição e vingança também estão lá, mas na hora em que o diretor tenta uma dita abordagem surrealista, onde usa metalinguagem e até mesmo dá poderes de parar o tempo ao personagem, a essência começa se descontinuar, perdendo o ritmo e desviando a atenção do espectador para aspectos desnecessários ou até inúteis de trama.
Os próprios efeitos especiais parecem apenas denotar o desejo de usá-los muito mais do que agregar na trama, visto que mais que 80% da história tem um tom teatral, isto é, poderia ser encenado num palco sem um design de produção tão épico.
O elenco está ótimo dentro do possível, mas as intervenções surrealistas de Coppola, aliado a um trabalho medíocre de edição, impedem que o público possa navegar na jornada emocional de cada um. Se com os protagonistas, Cesar e Júlia, já temos dificuldade de acompanhar esse arco de história, imagina com os coadjuvantes.
Chega um momento, lá pelo fim do segundo ato, que os estímulos do filme já não são mais absorvidos pelo espectador e daí é apenas uma questão de esperar acabar. O desfecho épico em termos de magnitude mais do que conteúdo, apenas carimba uma desenvolvimento que faz muito barulho, sem reter quase nada de valor.
“Megalópolis” é mais um daqueles projetos que de tantas idas e vindas, perde seu brilho e é realizado mais para cumprir um proposito pessoal do que contar uma história. Se Coppola está feliz, deixa o cara.
Curiosidades:
- De todo o elenco o único ator que estava certo desde o início do desenho do projeto há mais de 30 anos era Lawrence Fishburne. Ele e o diretor chegaram a conversar sobre o projeto nas filmagens do clássico “Apocalipse Now” de 1979.
- O filme já está como fracasso de bilheteria, mas o estúdio Liosgate lucrou porque Coppola tirou dinheiro do seu próprio bolso.
- O filme é dedicado a Eleanor Coppola, esposa do diretor, que faleceu em abril de 2024 durante a pós-produção do filme.
- A irmã do diretor, Talia Shire (a eterna esposa de Rocky Balboa) e o filho dela Jason Schwartzman (“Jogos Vorazes“) participam do filme.
- As cenas onde a tela se divide em três são homenagens ao clássico “Napoleão” de 1927 cuja restauração foi patrocinada pelo próprio Coppola.
- Primeiro reencontro de Dustin Hoffman e Jon Voight em um filme desde que fizeram “Sem Destino” em 1969.
Ficha Técnica:
Elenco:
Adam Driver
Giancarlo Esposito
Nathalie Emmanuel
Aubrey Plaza
Shia LaBeouf
Jon Voight
Laurence Fishburne
Talia Shire
Jason Schwartzman
Kathryn Hunter
Grace VanderWaal
Chloe Fineman
James Remar
D.B. Sweeney
Isabelle Kusman
Bailey Coppola
Madeleine Gardella
Balthazar Getty
Direção:
Francis Ford Coppola
História e Roteiro:
Francis Ford Coppola
Produção:
Michael Bederman
Francis Ford Coppola
Barry J. Hirsch
Fred Roos
Fotografia:
Mihai Malaimare Jr.
Trilha Sonora:
Osvaldo Golijov