O diretor Fede Alvarez conseguiu o mais difícil: estabeleceu conexões inteligentes desta sua nova produção com os “dois passados” da franquia: o mais recente na sua ordem cronológica em “Alien – O Oitavo Passageiro” é direta e imediata em seu primeiro ato (veremos a seguir), enquanto a conexão com o passado mais longínquo, com a dobradinha “Prometheus” / “Covenant” é sofisticada e inteligente, mesmo que escorregue no final.
Aliás esses dois filmes foram “a melhor coisa desconexa e inacabada da franquia” e que no final nunca chegou a se conectar como deveria com o clássico que começou tudo em 1979. Inclusive Alvarez fez exatamente a mesma proeza na franquia “Morte do Demônio” e se deu muito bem, sendo provavelmente um dos motivos de sua contratação para esta empreitada.
O que deveria ser a parte fácil do trabalho do diretor, entretanto, parece ter ficado pelo caminho: com as conexões feitas, bastava criar um filme envolvente, tenso e com personagens desenvolvidos. Nessa hora, babou (em saliva ácida).
Vamos por partes: um grupo de jovens (quase adolescentes) descobrem uma estação espacial das empresas Weyland (representando o capitalismo predatório, o verdadeiro vilão da franquia) com equipamentos que podem ser um passaporte de saída da vida que eles levam em seu planeta como mineiros da empresa. Ao chegar nesta estação, eles descobrem que além de equipamentos, nossos amiguinhos Aliens estão mais vivos do que nunca e então o terror se instala.
A primeira coisa a fazer é deixar o preciosismo de lado e não se perguntar:
a) Como que as empresas Weyland deixam à deriva uma estação espacial com material tão importante, não detectam sua presença e fica por isso mesmo?
b) Como um bando de jovens conseguem uma nave para chegar na estação que toda equipada é incapaz de se comunicar com o próprio planeta?
Virada essa página, o primeiro problema está no desenvolvimento dos personagens: com exceção da protagonista Cailee Spaeny de “Guerra Civil” e de seu melhor amigo andróide Andy (interpretado pelo ainda desconhecido David Jonsson), todos os outros personagens são simplesmente jogados como futura carne de açougue para os aliens. Não há nenhuma morte que traga qualquer tipo de sentimento ao espectador, até pelo fato que grande parte desses personagens são superficiais, vazios e alguns até mesmo detestáveis, inclusive um deles que parecia ser um ex-namorado de Rain, a protagonista. Seria coincidência Rain e Ripley começarem com a mesma letra?
Mesmo com esses personagens sem nada a oferecer, o filme vai entregando o que prometeu, com novas situações, aliens sanguinários (mas nem tanto), o destaque maior para os facehuggers (os bichinhos que grudam na sua cara para passar o hospedeiro), onde talvez as melhores partes sejam o do ácido na gravidade zero e – a parte mais inteligente – a constatação da grande propósito das empresas Weyland com os aliens, o que estabelece a inteligente e inequívoca conexão com “Prometheus”.
Ainda assim, há algumas forçadas de barra como a briga que ocorre num tubo para elevador, com uma cena com o nível “Velozes e Furiosos” de absurdo, além da apresentarem uma arma que, 20 anos antes de “Aliens – O Resgate” é muito mais moderna somente para encobrir o fato de que Rain não é Ripley e não tem nenhuma habilidade de guerrilha, o que pegou meio mal.
Mas nada poderia nos preparar para o último ato que talvez seja a melhor idéia, mas pessimamente materializada. Sem dar spoilers, dá para dizer que o último ato tem muito a ver com a dobradinha “Prometheus” / “Covenant”, onde, é claro Rain faz sua batalha final.
Primeiro que a formação da tal criatura e ela em si é fora de compasso, feia, sem razão de ser, mesmo entendendo o propósito do roteiro. Poderiam gastar uns 5 minutinhos a mais ajustando esse desenvolvimento para não ser tão absurdamente rápido assim.
Segundo, que o desfecho da batalha é uma confusão visual que ninguém se entende. Eu particularmente não consegui entender o que estava acontecendo em cena até o momento que a batalha termina e é possível apenas inferir o que houve. Essa luta me lembra bastante e terrível cena de luta do “Hulk” de Eric Bana com o vilão que mimetizava o ambiente, ou então as cenas de batalha incompreensíveis no primeiro “Transformers”.
Estamos num novo tempo onde não existem mais simples continuações, mas para espremer franquias e arrancar dinheiro do bolso dos fãs, esses filmes se posicionam no futuro, no passado, entre um e outro, ou até mesmo “no mesmo universo”.
Assim, “Alien Romulus” agrega com informações e conexões relevantes, uma boa dose de ação, mas não soube desenvolver seus personagens ou criar uma trama original que tornasse a experiência épica. Como já dito, um bom caminho que ficou pelo meio.
Curiosidades:
- O discurso final de Rain é semelhante ao de Ripley em “Alien – O Oitavo Passageiro”.
- O primeiro ato passado na colônia Weyland foi inspirado numa das cenas deletadas de “Aliens – Resgate” que também se passa numa colônia.
- Todos os profissionais ainda na ativa que fizeram os efeitos práticos das criaturas de “Aliens – O Resgate” foram contratados para fazer o mesmo trabalho no filme.
- Apesar do subtítulo do filme ser Romulus, isso se deve ao fato de que a estação espacial tem dois setores, Romulus e Remus, da mitologia grega.
- Aliás, Romulus era apenas o título de trabalho. Só que ele vazou e todo mundo começou a se referir ao filme como “Alien – Romulus” o que fez o diretor decidir por manter o nome.
- Quando a estação é reativada, a música que toca é a peça da orquestra de Wagner, “A Entrada dos Deuses de Valhalla”, que e a mesma música que o personagem sintético David toca no piano em “Alien – Covenant”.
- Quando a estação espacial reinicia é possível ver na tela o nome HAL9001 que é uma homenagem a “2001 – Uma Odisséia no Espaço” cuja contraparte tecnológica é o computador HAL9000.
***SPOILER – SÓ LEIA APÓS VER O FILME***
- Primeiro filme de toda a franquia onde os ovos dos Aliens não aparecem. Os Facehuggers saem de compartimentos experimentais.
- A partir do momento em que o sistema diz que o impacto da estação com o cinturão de asteroides ocorrerá em 30 minutos, o filme fica em tempo real e o impacto acontece exatamente 30 minutos após o aviso. Pode usar o cronômetro.
- O sintético Rook fala “Não posso mentir sobre suas chances, mas você tem meus pêsames” que é a mesma frase que o sintético Ash fala em “Alien – O Oitavo Passageiro”. Ambos são interpretados pelo mesmo ator Ian Holm, sendo que aqui, ele é criado por efeitos especiais já que Holm faleceu em 2020. O primeiro Alien de “Alien – O Oitavo Passageiro” é visto pendurado no teto de uma das salas da estação espacial, conforme o sintético Rook explica. O que pouca gente viu é que ele ainda tem no ombro o arpão que Ripley lançou nele.
Ficha Técnica:
Elenco:
Cailee Spaeny
David Jonsson
Archie Renaux
Isabela Merced
Spike Fearn
Aileen Wu
Rosie Ede
Direção:
Fede Alvarez
História e Roteiro:
Fede Alvarez
Rodo Sayagues
Produção:
Gergö Balika
Walter Hill
Michael Pruss
Ridley Scott
Fotografia:
Galo Olivares
Trilha Sonora:
Benjamin Wallfisch